Uma coisa que me incomodava desde antes de eu ter a primeira faixa etária de restrição de um filme (que antigamente era 12 anos) era a existência desse classificação. Em casa, claro, isso acaba não fazendo muita diferença; se os meus pais me deixavam ficar na sala vendo um filme e ele me interessasse, ótimo; senão eu ia fazer outra coisa.Não faz muito tempo que é obrigatório aparecer a classificação na tela embaixo de todos os programas de tevê, mas no cinema a coisa pega mais, e lembro que a lei já mudou várias vezes.
Quando eu tinha uns 11 anos fui ver A Bruxa de Blair com as minhas amigas da mesma idade (a classificação era 14a) e todo mundo entrou de boa - o que é lamentável, preferia ter ficado do lado de fora, considerando aquele lixo de filme. Algum tempo depois, pude entrar em Fim dos Dias só acompanhada da minha tia, que era um adulto maior de idade. Dali a algum tempo, tiraram a mim, minha irmã e a mesma tia da sala de As Panteras, isso mesmo, tiraram a gente no meio do filme, porque a minha irmã tinha só 10 ou 11 anos, o que é evidentemente uma idade muito jovem para assistir a um filme de tal complexidade e ainda com cenas tão pesadas de violência e sexo; onde estávamos com a cabeça de querer corrompê-la dessa maneira?! Sorte que trocaram os nossos ingressos para vermos o maravilhoso 102 Dálmatas! Irônico, porque uma semana antes tínhamos ido as três ver o primeiro "Todo mundo em pânico".
A classificação indicativa é feita, no Brasil, pelo “Departamento de Justiça, Classificação, Títulos e Qualificação” do Ministério da Justiça. Segundo eles, pessoas treinadas fazem um processo incrivelmente bom de seleção para preservar a nossa amada família feliz e pura, protegendo-a das perversões televisivas/ cinematográficas/ videogueimescas que possam tentar aliciar nossos filhos por um caminho de perdição.
Não acho ruim que os pais possam ter uma noção de que conteúdo gostaria que seus filhos pequenos assistam, ou que haja um horário apropriado para cada tipo de programação. É legal podermos escolher, pelo conteúdo, se queremos que alguém veja, se nós mesmos queremos ver ou ao lado de quem queremos ver.
Só que eu lembro que muita gente fala que tal filme tem censura 14a e não "classificação indicativa". Talvez por uma lembrança remota da época em que a tal censura era muito comum, mas há uma certa razão considerando que classificar o que você pode ou não ver não deixa de ser, afinal, censura.
Acho totalmente retardado que filmes com classificação 12 ou 14 anos sejam restritivos, e não só indicativos. Deveria haver uma explicação dos motivos da classificação etária, talvez até com uma descrição das cenas que a motivaram, como tem no imdb. Aí a pessoa resolve se quer ou não ver o filme, sendo ela menor do que a classificação etária. Ou talvez permitir que pessoas com 2 ou 3 anos abaixo da indicação entrem no filme, menores que isso só com autorização dos pais. Teve uma época em que acompanhadas dos pais, os menores de qualquer classificação etária exceto 18 anos podiam entrar. Faz um certo sentido, mas ainda acho que a restrição total de 18 anos é exagerada pra muitos filmes, e talvez devesse valer só pra filmes realmente pornográficos (que é a razão pela qual imagino que foi feita a exceção). Acho que sou conservadora o suficiente pra imaginar que não faz nenhum sentido você ir acompanhado de seus pais ver o novo sucesso da Emanuelle (argh).
Sei que o Estatuto da Criança e do Adolescente quer que os menores sejam protegidos, mas acho que, em primeiro lugar, cumpre aos pais algo nesse papel, e em segundo lugar, o serviço não está sendo feito muito direito.
Na verdade, eu tenho a sensação de que pessoas mal treinadas usando conceitos hipócritas levam a classificações inadequadas, ou mesmo ridículas. Não entendo, por exemplo, o fato de Harry Potter 4 ser 12 anos. Oh, ele é mais violento que os outros, ok, mas é um filme de criança! O lobo come a vó da chapeuzinho, e o caçador não menos sanguinário atira no bicho e abre sua barriga, então só vamos contar a historinha pros nossos filhos quando começarem a aparecer espinhas na cara deles. Algum nível de violência faz parte, é intrínseco da relação maniqueísta que está nas historinhas infantis. Por outro lado, vamos dar uma olhadinha nesses dois exemplos de filmes 14 anos: Closer - Perto Demais e Priscila, a Rainha do Deserto. O primeiro é um filme sobre relações amorosas, essencialmente fala de sexo, com diálogos de caráter sexual não muito fortes, mas provavelmente suficientes pra você desejar que a sua mãe não esteja na sala. O segundo é uma comédia sobre um grupo de travestis que viaja em um ônibus fazendo shows, e que tem alguma referência a uso de drogas, que eu me lembre. Minha vó tinha o VHS e eu assisti milhares de vezes quando era criança, com a família toda, porque adorava o filme.
Ué, mas será que só eu fiquei com a impressão que há um abismo entre as impropriedades dos dois filmes que, no entanto, receberam a mesma classificação? Ah, mas você não vai querer que o seu filho assista a um filme de travestis, não é mesmo? O fato de O Segredo de Brokeback Mountain ter recebido classificação 16 anos contraria o meu bom-senso que me diz que qualquer idiota vê que as cenas de insinuação sexual ou violência lhe renderiam no máximo um 14 anos, mas ainda assim o ministério nos diz que a presença de homossexualidade não aumenta a classificação indicativa de um programa, muito pelo contrário, a diversidade é estimulada e qualquer forma de preconceito é condenável por lei. Aham.
Então é isso, eu acho que seria ótimo ter uma classificação que me ajudasse a escolher o que eu quero ver ou o que eu acho que os meus filhos (ou a minha mãe) devem assistir, mas não quero para tal me basear em decisões tendenciosas que uns idiotas têm por aí. Não consigo me conformar que as criancinhas tenham que esperar Harry Potter sair na locadora enquanto assistem a Os Simpsons na TV Globinho. No site do Ministério da Justiça tem um novo espaço pra você procurar o nome de um filme num bando de dados, ver a classificação indicativa, o porquê dela e concordar ou discordar. Não sei se vai fazer alguma diferença, mas estou me divertindo xingando as classificações que acho ruins.
No fim das contas a solução pros pais preocupados é simples; no fundo no fundo as crianças deviam ver só TV Cultura, que são os caras em cujo bom-senso eu confio, mesmo porque eu lembro que as roupas que a Xuxa e a Eliana usavam não eram muito cristãs (claro, pro papai não mudar de canal).